quinta-feira, 25 de junho de 2009

Coelhinho Cor-de-Rosa.

As imagens eram meio borradas no começo. Como se os olhos marejados não deixassem que as coisas ficassem claras. Como se era para ser assim, um borrão.
Ele sabia que esse tipo de coisa acontecia, e ele ja havia vivenciado aquilo milhares de vezes. Mas por alguma razão, dessa vez foi diferente.
- Aqui, fique com isso. Ele queria terminar...ele queria que você terminasse.
Era um coelhinho desenhado e recortado, mas sem as orelhas. Só o que viu, foram as mãos de um alguém, naquele momento indiferente, entreguando-as. Ele ainda as estava fazendo, antes do 'grande dia', com a intenção de que ao terminar, fosse possível movimenta-las. A única parte do desenho/recorte que ele poderia mexer para todos os lados.
Ele lembrava daquele garotinho de cabelos escuros e um sorriso de criança no rosto, pintando esse coelho. Era uma das poucas imagens que lembrava e que sabia que nunca conseguiria esquecer. Um recorte simples, aos poucos criando forma, sendo feito por um garotinho de só 5 anos, que se encontrava naquela cama de hospital o tempo todo. E a risada que aquele menino deu naquele momento era uma coisa que nunca se apagaria. Não haveria como, e não haveria porque.
Ele mesmo, ainda estava com aquela roupa descartável verde. Impregnada de cansaço e misturada com sangue e decepção. Não se deu o trabalho de trocar. Não houve tempo e não houve vontade.
Ele ainda estava naquela sala, com um coelhinho cor-de-rosa mal terminado em suas mãos, que parecia pedir um final. Como se fosse a última coisa que faria por aquele garotinho de buchechas rosadas.
As orelhas do coelho estavam descartadas num canto daquele quarto branco. A única coisa que parecia dar cor àquele lugar. E então o tempo passou como se os segundos tivessem se transformado em horas num piscar de olhos. Não existia uma memória de ter terminado aquele recorte, nem como o fez ou aonde o fez. Só o que sabia é que havia o feito.
Só o que sabia é que estava do lado de fora daquele lugar que parecia não deixa-lo respirar. E que a noite estava linda. O céu estava lindo. Como a muito tempo não parecia estar.
Olhos doídos e molhados encaravam uma noite escura de estrelas e Lua cheia. O sorriso se formou curto, como se ao olhar para cima, ele pudesse ver aquele garotinho.
Tirou a touca que ainda cobria seu cabelo, deixou o vento tornar mais fácil a respiraração, e enquanto segurava aquele coelhinho cor-de-rosa, levou sua mão até a boca e mandou um beijo para o céu.
E então eu acordei.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Das fotos que eu não tirei.

Faz parte de quem eu sou. Eu não posso colocar isso em outras palavras, simplesmente porque faz parte de quem eu sou, por mais que seja sentimental demais, ou adolescente demais.É um momento meu, sozinho e ao mesmo tempo lotado. É difícil explicar, e talvez se o tentasse, pareceria também meio bobo.
Existem momentos. Existem dias. Até mesmo minutos. Memórias mal formadas, e lembranças recém começadas. São momentos que acontecem e que te fazem, na verdade me fazem, parar, olhar em volta e repetir comigo mesma “Não esqueça esse momento, não esqueça esse momento.” Como se fizesse parte das fotos que eu não tirei, e estivesse naquele álbum que eu levo comigo por onde quer que eu vá,tiradas pelos meus olhos e nada mais.
Eu tenho isso. Talvez porque memórias são importantes para mim, ou porque quando o mundo parece estar caindo diante de meus olhos são essas lembranças que me fazem continuar olhando para frente. Por mais simples que sejam, ou por mais rápidas que aconteçam. Sejam elas recentes ou não.
Foi uma paisagem incrível de inverno. As árvores deixavam cair as folhas mais bem desenhadas que meus pés varriam enquanto eu me balançava e meus primos tentavam se equilibrar no tronco de árvore caído ali do lado. Os adultos relembravam aquele pai com um sorriso bobo, de criança no rosto enquanto nos assistiam. Depois resolveram dar uma chance ao balanço.
Era final da tarde quando resolvemos descer até o lago e assistir o pôr-do-sol. E enquanto nós tentávamos fazer com que as pedrinhas quicassem na água pelo menos mais de três vezes, o sol refletia aquele lugar todo, as pessoas se sentavam contando aquela piada mais estranha, e aquele tio dizia como era incrível o fato do sol nascer e se pôr todo dia, e que naquele dia ele havia nascido só para nós e agora podíamos dizer um ‘até amanhã’. Que era incrível ele estar lá todos os dias, independente do que estivesse acontecendo.
Mais uma memória. Das fotos que eu não tirei, essa me deixou repetindo.
"Não esqueça esse momento, não esqueça esse momento."